sexta-feira, 10 de abril de 2009

Coração de Detetive - Parte I

Está é a primeira parte do Perfil escrito por Renata Gere e Tico Dias.
A próxima parte será postada na próxima segunda.

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Minha vida é um filme... Policial

“Minha filha entrou na faculdade agora e só vive no telefone cochichando. To desconfiada que ela está metida com drogas. Eu queria saber o que ela tanto conversa”. “A senhora pode grampear o telefone”. “Como?”. “Eu tenho esse aparelho, leva, junta alguns fiozinhos e pronto, grava tudo”. “E quanto é?”. “A senhora pode levar emprestado e me traz de volta em uma semana. Se não voltar, a senhora vai pro inferno, hein!”

Ricardo Ferreira, 40 anos, é detetive há 17 anos, mas ainda mantém o mesmo brilho nos seus intensos olhos azuis, ao contar seu primeiro caso na profissão, quando uma empregada doméstica veio lhe consultar sobre possíveis problemas da filha.
Constantemente ri de si mesmo. Ao relembrar o difícil começo, quando mesmo atolado em “compromissos”, como prefere chamar suas dívidas, deixava se envolver emocionalmente com os casos e agia mais com o coração que com a razão. Emprestou o gravador e recebeu como “pagamento”, bolinhos de chuva.

“Mas Deus estava vendo minha boa ação e um tempo depois eu recebi minha primeira ligação importante, que não teria acontecido não fosse esse meu gesto com aquela senhora”, reflete. O chefe de sua primeira cliente era um grande empresário, que acabara de receber a missão de trazer uma reconhecida empresa japonesa para o Brasil e, para tanto, precisava “vigiar” os seus vendedores de todas as formas, inclusive grampeando seus telefones.

O empresário requisitou seu serviço e encomendou 500 aparelhos, iguais aos que havia emprestado anteriormente. Acontece que o aparelho era importado, uma tecnologia que ainda faltava no Brasil, mas que Ricardo conseguia através de contatos no exterior. “O cara me perguntou quanto tempo eu levaria para consegui-los, eu disse: 15 dias! E ele retrucou: se forem em 15 dias mesmo, diga 30, é mais garantido e se você entregar antes, mostra o quanto você é eficaz. Aí eu fechei: 40 dias, então!”.

Ricardo se considera um eterno aprendiz e diz que não houve um cliente que não tenha deixado alguma lição importante a ser guardada. Mesmo o fechamento desse primeiro grande negócio serviu para mostrar o valor do dinheiro, ou melhor, da falta dele. “Depois dos aparelhos eu pude pagar o Manoel da padaria, a quem eu devia por semestre (porque dever por mês é seguir uma mentalidade pobre), acertei com a minha secretaria e paguei o aluguel atrasado. Comprei também um carro, que vivia cheio de mulher, enfim, foi uma época boa”, diverte-se.

Ele foi matéria de capa do Jornal do Comércio, que destacou o fato de ser dono de uma empresa de Detetives aos 24 anos, tempos depois foi também pauta de reportagem do Estadão, mostrando as incríveis tecnologias utilizadas em espionagens. Todo esse envolvimento com a mídia trouxe grande retorno financeiro, que não foi mantido, mas sim “bem gasto”, segundo Ricardo. “Eu aproveitei bem, cheguei a comprar até um Audi e colocar a placa ESP0007. Me dava muita moral, os clientes viam que eu tinha e oferecia sucesso, então confiavam e pagavam o preço que eu quisesse”.Hoje, em seu novo escritório-casa, no bairro da Água Branca, pouco ainda resta das extravagâncias do passado. Mas contrariando a idéia de frustração ou qualquer nuvem de arrependimento que possa pairar sobre sua cabeça, Ricardo diz que está hoje exatamente onde deveria. “Tudo na vida é aprendizado. Eu saí de casa cedo. Fui morar sozinho, que foi o primeiro dos grandes desafios: abrir mão do conforto de ter mãe e avó sempre do lado, fazendo tudo por mim, até hoje sinto falta. Mas se não guardei nada, se não tenho grandes bens, ao menos ficou o aprendizado, isso eu não perco”.

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